quinta-feira, 12 de março de 2009

Eu estive lá!

(Att: Artigo muito extenso, se não gosta de ler, passe à frente)
Dia 4 de Agosto. Cheguei a Lisboa por volta das 10:30. Estava cansado. Contente e triste ao mesmo tempo. Contente porque estava ali, defronte do novo “Estádio José Alvalade”, e triste porque já só havia bilhetes para sócios. E só dos mais caros, era o que vinha escrito nos jornais e era o que diziam na televisão. Ainda assim estava uma fila considerável rumo à única bilheteira aberta. É só para sócios, pensei, e segui em direcção à Loja Verde. Lá, comprei um cachecol “Stromp” e uns chinelos para o Pedro. “Deixa lá, filho, vemos o jogo na televisão”. À saída da Loja Verde, por curiosidade, perguntei a um segurança se ainda havia bilhetes para “não sócios”. Respondeu-me que sim. Perguntei-lhe se eram os de 120€. Disse-me que não, inclusivamente havia ainda de 60€ e 80€. Renasceu a esperança. Vou para a fila (que estava maior agora…), que se lixe. São agora 11h20. “Manela vai levantar 160€ ao multibanco, se fazes favor, até 80€ ainda compro bilhetes, a 120€ não posso. “Filho não alimentes esperanças, quase de certeza que quando o pai chegar à bilheteira já só há bilhetes dos mais caros, e eu não posso dar 120 €uros por cada bilhete”, disse-lhe eu. “Eu sei pai”, respondeu-me com voz triste. Enquanto eles foram levantar dinheiro fiquei na fila a “apalpar o pulso” àquela gente. Uns dizem que há bilhetes, outros dizem que não há. Um homenzinho vende garrafas de água, das pequeninas, a 1€ cada. Se eu fizesse o mesmo quando chegasse à bilheteira já podia dar 240€ por dois bilhetes… porra é muito dinheiro! 80€ x 2 também é, mas… afinal de contas não é um jogo qualquer. É histórico, é a inauguração do novo estádio do Sporting! Contra o Manchester United! Daqui a cinquenta anos ainda a malta vai estar a falar deste jogo. Era um sonho conseguir fazer parte desse momento. Poder dizer “Eu estive lá!”.
Começa a sair o primeiro grupo de pessoas que foram comprar bilhetes, desde que eu estou aqui, passa um por mim e vai a falar ao telemóvel. Nem de propósito, parou a cinco metros de mim, está a dizer que… “já não há bilhetes. Lotação esgotada. Já só há para sócios e dos mais caros…” merda, penso eu, morreu o sonho. Quando a Manela e o Pedro chegarem, vamos p’ró hotel. Eu e dois senhores que estavam à minha frente ia-mos sair da fila quando um deles disse “eu vou lá acima confirmar, guardem-me aqui o lugar…” dois minutos depois regressou com a notícia “o gajo que estava ao telefone é passado dos cornos, o segurança diz que ainda há bilhetes de 60€, 80€ e 120€!”. Nós aqui na fila passamos do sonho à desilusão em poucos segundos. Tenho fome, sede e ‘tou cansado. A malta diz que só daqui a duas ou três horas é que chegamos à bilheteira. Quero ver ao fim deste sacrifício todo, chegar lá e já não haver, entradas para não sócios, a 80€! A Manela e o Pedrocas estão de volta. Já tenho dinheiro para dois bilhetes até 80€. Volto a dizer ao meu filho que não conte muito com o “ovo no cú da galinha” não vão as contas sair furadas. O rapaz diz que compreende e a Manela decide que vão à procura do hotel Roma enquanto eu fico ali a tentar a minha sorte.
É meio-dia. A fila parece que não anda. Lá em cima da escadaria aparece uma figura estranha, meio homem meio mostrengo. É uma espécie de “bola 7”, o famoso “torcedor” brasileiro do futebol de praia. O tipo é enorme e disforme, é grande e gordíssimo! Não fala, solta enormes urros. É uma espécie de meio gorila, meio homem! Está também a vender garrafas de água a 1€ cada… é ajudante do “chico esperto”. Entretanto correm as mais variadas notícias sobre os ingressos para a noite mágica. Uns dizem que há, outros falam em lotação esgotada. O meu ”vizinho” da frente está comigo na luta, diz que só compra bilhete se tiverem de 60 ou 80 euros. De 60 é impossível, comentamos nós, devem ser os de sócios que para os que não são sócios custam 120… o consorte de trás, emigrante em França, diz que compra seja qual for o preço, ainda por cima é sócio. Este está garantido. A malta já fez amizade, estamos na fila à mais de uma hora, é meio-dia e meia, estamos quase a perder a protecção da paragem dos autocarros que nos dá sombra, daqui a pouco começamos a subir as escadas e é ao sol… e aqueles cabrões querem 1 euro (duzentos paus) por uma garrafinha de água de 0,33l… a Manela quando foi para o hotel quis-me deixar o boné do Pedro e eu não quis, fui burro, daqui a bocadinho vou começar a “fritar” os miolos. Há outro tipo à minha frente que vai comprar bilhetes para a família toda, tem aspecto de quem pode comprar o estádio, aspecto e “patuá”, o tipo fala por sete, deve ser vendedor! Foi ele que foi à bocado saber se ainda havia bilhetes ou não. Este tal, diz que está a “marcar um mano” que anda para lá e para cá com um jornal enrolado debaixo do braço e já foi à bilheteira “n” vezes. Deve ser da candonga, dizemos nós, está a comprar o pouco que há para depois vender pelo dobro ou pelo triplo. Só não entendemos, é qual o tipo de acordo é que o “magano” tem com o segurança, que o deixa circular livremente, enquanto nós temos que estar aqui na fila, ao sol, como carneiros! São estes “manfios” que dão “má fama” aos seguranças. Passamos palavra, e a contestação sobe de tom, vai fila fora até chegar ao segurança que, curiosamente, troca um olhar cúmplice e comprometedor com o tipo do jornal enrolado debaixo do braço. O sujeito raspa-se de “fininho” deixando o guarda, como diz o nosso “fala-barato”, em maus lençóis. Tão maus, que o homem tem que ser substituído por outro colega que estava junto à porta das reservas dos bilhetes de época e “game box”! O caso esteve preto, o homem ia levando na corneta, mas apareceram dois “bófias” e a cena acalmou. A Manela ligou-me a dizer que já tinham chegado ao hotel. Ficou espantada quando lhe disse que ainda não tinha chegado à escadaria.
É uma hora da tarde. A espera, em caminhada lenta, continua agora ao sol escaldante. Já perdemos a sombra. Em contrapartida estamos mais perto dos papéis que dão direito a viver o sonho.
Do lugar onde me encontro, dá para ver o moribundo estádio José Alvalade, mesmo aqui ao lado. As bancadas já não tem cadeiras, aliás um quarto do estádio já nem tem bancadas. O relvado está revolto, terra, erva, pedra e tijolo. Dá pena. Relembro dois jogos que lá vi, não me lembro em que ano foi, ainda o estádio não tinha cadeiras, sentávamos o traseiro no cimento frio. Talvez princípios dos anos 80! O primeiro jogo que lá vi foi um Sporting – Benfica, para a Taça, o Sporting ganhou, salvo erro por 2-1 (também pode ter sido 1-0, já lá vai tanto tempo!). Nessa mesma época, voltei a Alvalade para assistir ao Sporting – FC Porto, ainda para a taça de Portugal. O resultado final foi de 1-1. O Sporting seria eliminado no segundo jogo, nas Antas. No Sporting dessa altura jogavam o Damas, o Manuel Fernandes, e o Jordão; No Benfica o Bento, o Chalana, e o Nené; No Porto o Fonseca, o Gabriel, e o F. Gomes, entre muitos outros. Vinte anos mais tarde, no ano 2000, voltei aqui, já com o meu filhote e a Manela. Viemos assistir ao particular de pré-época (jogo de apresentação aos sócios) Sporting – Real Madrid. O Sporting, Campeão Nacional, ao fim de dezoito anos (!) jogava com Peter Schmeichel, André Cruz, Alberto Acosta (El Matador), contra os Campeões Europeus, Figo, Casillas, Roberto Carlos, Morientes, Raúl, entre outros. O Sporting ganhou por 2-1 (golos de A. Cruz, Acosta e R. Carlos) e o A. Cruz ainda falhou dois pénaltis (pénalti, mais repetição do mesmo) nos últimos minutos! Foram os três únicos jogos que lá vi ao vivo! Foi naquele relvado que Ivkovic defendeu um pénalti do Maradona…
Voltando ao presente. Atrás de mim, o emigrante, a mulher e duas filhas pequeninas. As miúdas choram, como que pedindo à mãe que tenha mais juízo que o pai, e as tire dali, daquele sol de Verão. Ao fim de mais de meia hora de choro e choraminguisses, as meninas lá conseguiram que a senhora as levasse a visitar a nova “Loja Verde”. Pelo menos lá dentro há sombra! À minha frente – muita gente – o tipo que também não quer pagar 120€, o outro que paga o que for preciso, um velho sócio chato e ranzinza, dois ingleses do Manchester, que vão olhando para o estádio e fazendo comparações com o seu “Old Trafford”, um africano que tem instruções muito precisas do seu pai “…compra a merda dos bilhetes nem que tenhas que pagar 100 contos por cada um! …”. Mesmo atrás do emigrante “francês”, está um inglês que fala com alguém ao telefone e diz “…yes, I’m here, in the new Alvalade stadium to buy the tickets to the Sporting game… if I fucking survive…” a seguir faz outro telefonema para o… “Allô Pizza” a encomendar o almoço (e esta hein!?).
Tenho a camisa colada ao corpo. A cabeça quente. Porra, que Lisboa é mais quente que o Algarve! Sinto o corpo fraco. Afinal levantei-me às seis da manhã, conduzi durante cerca de três horas, estou aqui a pé à mais de hora e meia, sem comer e sem beber… o que eu não faço pelo Sporting! Bom, confesso que não é só pelo Sporting. É também, e principalmente, pelo meu filho. Parece que o estou a ver, e a ouvir, daqui a quarenta ou cinquenta anos, a dizer aos filhos e aos netos “… estive aqui com o meu pai, vosso avô e bisavô, no dia da inauguração. Foi um dia inesquecível, uma noite mágica… até chorei de alegria quando o jogo acabou. Nunca mais me esqueço! Foi de facto um dia, e um momento histórico!
Deus me ouça e que assim seja. É por este sonho que eu estou aqui!
Confesso que me chegou a passar pela cabeça – deve ser do sol e do cansaço – que, se quando chegasse à bilheteira, já só houvessem bilhetes de 120€, comprava um para mim, e o Pedro via com a mãe pela televisão. Desculpa filho, mas acho que tenho esse direito. Afinal quantas horas vou ter que esperar aqui, em pé e a fritar o couro cabeludo? Depois deste sacrifício, só um louco volta para trás sem bilhete! Tu vais entender. Tens a vida toda pela frente para ver o Sporting. Quem sabe se vais estar na inauguração do que vem a seguir a este!? Afinal o tempo médio de vida de um estádio é de cerca de cinquenta, sessenta anos… e tu tens onze. Eu é que se perco esta oportunidade não tenho outra! Mas… que raio é que eu estou para aqui a pensar? Ir ao jogo sem o meu companheiro!? Não há dúvida que estou a enlouquecer. Não! Está completamente decidido, ou vamos os dois ou não vai ninguém!
“… Vem um gajo do Algarve até aqui, e arrisco-me a voltar para trás sem bilhete! …”.
“Você vem do Algarve?” pergunta-me um dos meus “vizinhos” da frente. “Opss, estava a pensar em voz alta! Sim, não sou de lá mas venho do Algarve!” respondi-lhe. “Descanse, amigo, que vamos arranjar bilhete!” disse-me com convicção. “Deus o ouça!” desabafei eu.
São quase duas da tarde, a Manela e o Pedro vão ter comigo, já eu estou a meio do percurso, e dizem-me que vão almoçar nos bares da estação do Metro. O Pedro pergunta-me se haverá bilhetes. Respondo-lhe que vou até ao fim, mas para não pensar muito nisso porque, quase de certeza vamos ver o jogo pela televisão. Eles vão e eu fico ali. Já mais perto da bilheteira. Já a vejo ao longe! Merda, está lá tanta gente! Não há-de ser nada. O velho sócio continua a resmungar, agora ouvi-o perfeitamente dizer que “Se só vendessem bilhetes para os sócios, não tínhamos que apanhar esta seca toda… vendem para toda a gente… ando todo o ano a pagar quotas e tenho que estar aqui ao sol! …” Pronto, agora vou-me passar, olha o cabrão do velho… “Ouça lá, você pensa que só os sócios é que são sportinguistas? Vá viver para o Algarve, depois de nascer no Porto, que eu quero ver se você é sócio! Olhe que você não é mais sportinguista do que eu, ouviu? Se é sócio viesse comprar bilhete no dia 1, que foi quando as bilheteiras abriram para vocês… olha a porra!” O homem não respondeu, até porque alguns concordaram comigo e ajudaram à “festa”, mas a malta não quer barulho, a malta quer é bilhetes, por isso não “adiantamos serviço”.
São duas e dez. Aproximamo-nos das barreiras que separam a fila do espaço livre entre nós e a bilheteira. Vem um tipo da organização, da SAD ou do raio que o parta, de caneta e bloco de apontamentos em riste, perguntar-nos quantos bilhetes queremos e se somos sócios ou não. Pronto, é agora. Vai dizer que já não há bilhetes para os não sócios. Agora é que o velho se ri de mim! … Não! Calma! Parece que há para todos… “O Sr. quantos quer, se faz favor…preciso de saber para ver se ainda vos deixo entrar, é que estão mesmo a esgotar… já não há de todos os preços!” Eu não digo, que aqui na fila, passamos do sonho à desilusão em poucos segundos! O coração parece que me quer saltar do peito, já não tenho fome nem sede, quero é que este gajo me diga se “…ainda tem, para não sócios, de 80€?”… “… tenho, quantos quer?” (yes, yesss, yessssss, apetece-me dar um beijo na testa deste tipo) “quero dois, se faz favor” digo eu num tom aparentemente calmo. “Ok” responde-me ele. O meu sofredor da frente, olha para mim, sorri e pisca-me o olho, como quem diz – parece que nos vamos safar! Sorrio-lhe de volta. Começa a doer-me a cabeça, a camisa já é uma segunda pele. O tipo separa agora portugueses de ingleses “é para não ficarem juntos na bancada” diz. O inglês que está dois lugares atrás de mim diz que “sou de Manchester mas vivo em Lisboa, e sou do Sporting” Ficamos todos espantados, o sotaque não engana, o tipo é “cámone” mas diz que é “suportter” do Sporting (!), tá bem.
São duas e vinte, estou aqui há três horas! Mandam-nos entrar! Até as pernas me tremem, porra. Está quase, estou quase lá… cheguei! Foram as únicas passadas largas que dei nas últimas três horas, estes cinquenta metros sem barreiras e sem ninguém à frente, pareciam dez quilómetros! O “bétinho” rico já comprou bilhetes de sócio, “custaram-me 60€ cada” disse ele. Pois, são os tais de 120, pensei eu! Chega a vez do meu camarada da frente… “quero dois de 80€, de não sócios” pediu o homem à senhora alta e de óculos, que olhava fixamente o monitor do computador, como um burro olha para um palácio “… de 80€ já não tenho!” disse ela secamente! Meu Deus, ajuda-me… ficamos os dois a olhar para ela sem conseguirmos dizer nada. Ficamos paralisados por breves segundos. Bom, o homem não fala, falo eu! “Olhe, a Sra. desculpe, mas deve haver algum engano. Um Sr. da organização esteve a falar connosco e disse-nos que havia bilhetes de 80€ para a malta que não tem cartão de sócio… estamos a pé e ao sol há três horas… não me diga que não tem bilhetes… eu não saio daqui sem bilhete… e não vou levar de 120€… a Sra. veja lá bem…” a funcionária deve ter visto que eu estava a “mudar de cor” e antes que eu desfalecesse ali, interrompeu-me e disse “… mas tenho de 60€…”. “Mas qual 60!? – retorqui eu – já lhe disse que não sou sócio e este Sr. também não! Não podemos pagar 120 por bilhete…” eu já não sentia as pernas e começava a faltar-me a voz, bolas que me estava mesmo a sentir mal… “Ó Sr. eu tenho bilhetes de 60€, não são para sócios… acabaram os de 80€ mas ainda tínhamos uma reserva de 60€ “ Finalmente caí em mim, depois da tempestade vem a bonança, isto, ao fim e ao cabo, ainda me saiu melhor que a encomenda… não só consigo os ingressos como ainda levo troco! Maravilha – pensei – agora é que o raio do coração me salta pela camisa fora! E a dor de cabeça a aumentar! Mas já nada me importa, eu quero é agarrar os bilhetes. Entretanto o meu colega da frente já está aviado. Feliz da vida, quase que me dá um abraço, cumprimenta-me e deseja-me sorte. Chega finalmente a minha vez! “Boa tarde, sendo assim quero dois “não sócios” de 60€, se faz favor…” a senhora olha para o teclado, de soslaio por cima dos óculos, e diz “só há um problema…” não, não aguento mais! O que será agora! “… não tenho dois lugares seguidos, tenho o 1 e o 5 desta fila… tem que ficar separado quatro lugares!” diz-me ela com a maior das naturalidades. Estive quase a dizer-lhe que sim, mas… também já que sofri tanto até chegar aqui, vou lutar mais um pouco! “… Não, desculpe lá, a outra pessoa é o meu filho que tem 11 anos, e eu não o quero separado de mim dentro do estádio…” nesta altura ela coloca de lado os dois bilhetes e chama um colega para a auxiliar. O pessoal que está na fila começa a resmungar com a demora. Viro-me para trás e mando-os calar – eu hoje estou por tudo! – estamos aqui à três horas, não podem esperar mais cinco minutos? Por esta altura, já o funcionário tinha conseguido desbloquear o problema. Passo o dinheiro para dentro do “guichet” e a senhora passa-me os dois bilhetes. Dois bilhetes de 60€ cada para o Sporting – Manchester! Obrigado meu Deus, consegui! Agarro nos papéis, com força, olho para eles e guardo-os cuidadosamente na bolsa que trazia à cintura. Cumprimento o restante pessoal que ficou na fila, e olho ao longe, os outros aflitos. Ansiosos. Que tentam entrar naquele espaço onde o sonho fica mais perto. Passo por uma série de pessoas que me perguntam se ainda há bilhetes… porque é que estão a demorar tanto tempo… a que preços são os bilhetes. Vou respondendo conforme posso, e sei, a todas as solicitações. Deixem-me em paz – digo eu para os meus botões – vocês não vêem que eu quero é correr e gritar de felicidade. Quero sair daqui aos saltos a gritar para toda a gente: JÁ OS TENHO! Saiam-me da frente, quero ver os olhinhos do meu filho, a brilhar, quando lhe mostrar os bilhetes! E continuei com o meu passo calmo e firme, como se nada se passasse. Ainda pude ver, pelo canto do olho, alguns que me olhavam de modo estranho. Alguns com vontade de terem aquilo que eu levava comigo! Tenho que ter cuidado – pensei – agora sou um alvo a “abater”, ou a assaltar. Vou-me pirar daqui, do meio da confusão.
Pego no telemóvel e ligo à Manela. “Então já almoçaram? Diz-me onde é que estão para ir ter com vocês…” “Conseguiste os bilhetes? Estamos no bar do Metro…” (...) “Já vou ter com vocês…”Estou a ficar paranóico, cada pessoa que olha para mim tem cara de quem quer os meus bilhetes. Estou a precisar de comer e beber alguma coisa, estou a delirar, é do cansaço e do sol! Finalmente encontro-os, sentados a uma mesa com os pratos vazios à frente. Esperam-me. Nem os deixo falar… “Tanta merda e tanto cansaço para isto… não posso mais… filho, deixa lá, o jogo dá na televisão…” O miúdo nem me respondeu, limitou-se a fazer um trejeito com a boca e abanar a cabeça afirmativamente. De repente pisco um olho à Manela e mostro os bilhetes ao Pedro! O rapaz ia saltando da mesa para me abraçar “Conseguiste pai, conseguiste… vamos ver o jogo… obrigado pai…”, o abraço foi longo e apertado, o pessoal ficou todo a olhar para nós, espantado com tal reacção. Até eu fiquei meio admirado, pois o miúdo não costuma ser tão expansivo e emotivo!
Guardei os bilhetes e pedi um bitoque. Finalmente vou comer, finalmente estou sentado, e aqui há água sem ser a 1€ cada garrafinha!
Enquanto como, vou respondendo às perguntas da minha mulher e do meu filho, e contando as minhas aventuras das últimas três horas.
(…)
06 de Agosto. Fim da tarde. Saímos do Hotel equipados a rigor em direcção ao Metro. A minha mulher e a minha irmã foram até ao “El Corte Inglês” enquanto “os homens” iam à bola.

O resto, já toda a gente conhece. O Sporting venceu por 3-1. Eu lembro-me bem… mas o mais importante é que o meu filho jamais esquecerá!

José Manuel Sarmento – Agosto 2003

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